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A vacina é luta histórica, cultural, exigência civilizatória e jurídica

A vacina é luta histórica, cultural, exigência civilizatória e jurídica

Por Rodrigo Pacheco, Rodrigo Azambuja e Pedro Carriello 

A história das vacinas começa no séc. XVIII. Nunca foi fácil. Em 1796 a primeira vacina foi descoberta por Edward Jenner, a partir da pústula formada pelo vírus vaccinia nas tetas das vacas.

Já naquela época, houve desconfiança de parte da população a respeito da eficácia do método de cuidado com a saúde desvendado, a ponto de o Papa Pio VII afirmar que “Deus não pode querer que sua obra seja maculada, permitindo que se inocule no homem a linfa de um ser inferior, como é a vaca”.

O receio também chegou em território nacional, e foi tamanho que provocou uma revolta popular: a Revolta da Vacina, somada a crise habitacional, a violência das remoções e algumas arbitrariedades, resultando indignação coletiva(Lira Neto).

Não obstante a resistência inicial à vacinação, a evolução científica sobre o tema e os resultados positivos nos cuidados à saúde levaram ao crescimento da confiança coletiva nos processos de imunização. O Brasil tornou-se referência mundial. Culturalmente esse hábito vem dos avós aos pais e esses aos filhos…

Faz parte do processo civilizatório. A marquinha no braço ou a gotinha virou um bem público, um direito individual mas que perpassa pela sua natureza de saúde integral e coletiva, e também dever dos pais/responsáveis.

Essa estrutura constitucional somada a imposição do ECA, art14, §1º, e outras normas, resultou naturalmente na existência de um Programa Nacional de Imunização com campanhas de vacinação como poliomielite, tuberculose, meningite, febre amarela, influenza, varíola etc. 

Em 2020  o STF em tema de repercussão geral no ARe 1.267.879  decidiu em tema de repercussão geral que não há possibilidade dos pais e responsáveis deixarem de vacinar os seus filhos, tendo como fundamento convicções filosóficas, religiosas, morais e existenciais.

As defensorias públicas dos estados e df participaram do debate como amici, em especial com olhar protetivo à criança e adolescente mais vulnerável, periférico, pobre e sem informação. Apresentamos dados sobre o PNI, que imunizou e imuniza diversas crianças e adolescentes, além da população adulta, que também é destinatária das ações.

O Brasil sempre foi referência mundial por ter conseguido, num país com a dimensão continental e marcado por profundas desigualdades regionais e sociais, reduzir consideravelmente a ocorrência de óbitos por doenças imunopreviníveis.

Atuação se dá por um federalismo cooperativo, sendo essencial uma política integrativa com todos os entes, do governo central aos municípios.

Lamentavelmente, após mais de 600 mil mortos, perdas irreparáveis e danos causados pela covid-19, o Governo Bolsonaro tem uma ação política trágica, violadora de direitos humanos, negacionista, sempre com um discurso contra à vacina, que remonta às épocas medievais, e em franca oposição à própria ciência, e às evidências mundo afora:. milhões de doses da vacina aprovada pela ANVISA já tem sido administradas em outros países, sem qualquer evento adverso significativo noticiado.

Também é bom lembrar que esse comportamento irresponsável do governo tem provocado diminuição das coberturas vacinais entre menores de 01 ano de idade, sendo inferior ao mínimo desejado nos anos de 2017 e 2018, o que tem sido atribuído, em grande parte, à disseminação de falsas informações a respeito da segurança de vacinas (SBIm).

A ideia de colocar consulta pública destrói por completo a ciência, os pesquisadores e as instituições, e todos os avanços em saúde pública, e a considerável redução da mortalidade infantil, já conquistados pelo PNI e outras políticas públicas.

Em última análise, faz letra morta a doutrina da proteção integral que assegura às crianças, com absoluta prioridade, o direito à vida e saúde. 

Não se pode ter voluntarismo quando a ciência, pesquisas, experiências e dados reveladores caminham pelo acerto da imunização vacinal. Não há liberdade de escolha na proteção vacinal em relação à criança, não há uma espaço de decisão permitida.

Como alertamos na ação já julgada pelo STF a respeito da responsabilidade de os pais vacinarem os filhos: os pais podem muito, mas não podem tudo em relação aos filhos.

Não à toa que o STF decidiu: “É constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que, registrada em órgão de vigilância sanitária, (i) tenha sido incluída no Programa Nacional de Imunizações ou (ii) tenha sua aplicação obrigatória determinada em lei ou (iii) seja objeto de determinação da União, Estado, Distrito Federal ou Município, com base em consenso médico-científico.

Em tais casos, não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar”. A defensoria pública tem seu múnus no campo do Direito; a vacinação tem o seu na área da imunização e na proteção, ambas são essenciais na luta por uma saúde pública, coletiva e integral.

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