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Carta Aberta Brasil Mulheres

Carta Aberta Brasil Mulheres

À nação, a presidenciáveis, a candidatas e candidatos ao executivo e ao legislativo,

Reunidas na cidade de São Paulo, em 28 de janeiro de 2022, ano do bicentenário da Independência, da celebração dos 100 anos da Semana de Arte Moderna e dos 90 anos da aprovação do voto feminino, representativas de vários segmentos e setores da sociedade, dirigimo-nos à nação brasileira manifestando-nos por uma maior e mais efetiva participação das mulheres brasileiras na vida nacional, bem como no processo político eleitoral de 2022.

Nossas vivências diversas e o repertório dos movimentos feministas, de mulheres negras e indígenas, de mulheres cis e trans, da cidade e do campo, heterossexuais e LGBTQIA+, de diferentes classes sociais, religiões, faixas etárias, escolaridade, corpos, deficiências e regiões do Brasil compõem as premissas para a construção de uma sociedade mais democrática.

Avaliamos como primordiais e imprescindíveis que sejam levados em conta, debatidos e futuramente compromissados em um grande pacto nacional, de forma interseccional, antirracista e considerando as múltiplas diferenças e desigualdades entre mulheres, os seguintes pontos que seguem:

  1. Não aceitar qualquer retrocesso nas leis que garantam os direitos das mulheres. Não vetar avanços oriundos do Congresso Nacional aos diretos das mulheres;
  1. Paridade transversal de gênero e equidade de raça nas instituições públicas, políticas e privadas;
  1. Estímulo e facilitação de candidaturas femininas competitivas. Garantia de cumprimento da legislação eleitoral em relação às mulheres;
  1. Garantia da alocação de recursos para políticas públicas destinadas a meninas e mulheres nas leis orçamentárias (plano plurianual, lei de diretrizes orçamentárias e lei do orçamento anual) e ferramentas efetivas para acompanhamento da execução desses gastos;
  1. Desenvolvimento de macropolíticas econômicas e sociais com vistas à geração e manutenção de empregos e renda para mulheres. Acesso a crédito para mulheres empreendedoras; conexão com inovação, programas de educação empreendedora para geração de renda; acesso ao mercado por meio de cotas de compras de empresas públicas e privadas. Qualificação profissional, para autonomia financeira, de mulheres negras, indígenas, quilombolas e em situação de vulnerabilidade social;
  1. Implementação de uma política de renda básica universal capaz de mitigar a pobreza, a fome, as desigualdades socioeconômicas e violências decorrentes;
  1. Universalização da educação infantil, garantindo o atendimento aos indicadores nacionais de qualidade para esta etapa de ensino. Promoção da oferta educacional laica e gratuita e a ampliação da escolaridade. Cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação. Incentivo à educação em ciência, tecnologia e empreendedorismo para meninas e mulheres, com atenção à juventude negra. Priorização na educação em geral e na educação de jovens e adultos (EJA), possibilitando que as mães estudem no mesmo período que os filhos e/ou criando espaços de cuidado para crianças no local de estudo da mãe;
  1. Construção de um programa nacional de incentivo a formação de novas gerações de atletas femininas (cis e trans) em diversas modalidades, incentivando o investimento na manutenção das potências esportivas que atuam e representam o Brasil.
  1. Ampliação de políticas de ações afirmativas étnico-raciais reparatórias – educacionais, de paridade econômica e memória – visando a erradicação das desigualdades socioeconômicas existentes na sociedade;
  1. Promoção da saúde integral da mulher ao longo de todo o ciclo de vida, com especial atenção à mulher idosa. Manutenção e expansão dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Investimento em pesquisas científicas, campanhas preventivas e de estímulo à vacinação. Valorização e defesa do Sistema Único de Saúde (SUS);
  1. Reconhecimento do trabalho doméstico e de cuidados, como centrais à vida; reengenharia do tempo e fortalecimento da economia dos cuidados para melhoria das condições de vida e bem-estar das mulheres. Atenção ao tema da economia do cuidado (ou do trabalho reprodutivo) por meio de políticas públicas e arcabouço normativo que valorizem o trabalho, remunerado ou não, das mulheres que cuidam;
  1. Respeito e preservação dos direitos de todas as famílias em suas múltiplas manifestações. Ampliação da licença parental com equidade de gênero. Educação masculina para os cuidados. Políticas públicas que se guiem pela proteção das mulheres nas violências intrafamiliares. Garantia de vagas em creches de forma contínua, em período integral, para todas as crianças na condição de serviço público essencial. Iniciativas de amparo às crianças e adolescentes com mães presas, órfãos do feminicídio ou mães em situação de extrema vulnerabilidade;
  1. Enfrentamento ao discurso de ódio, violência política e institucional e cerceamento da liberdade de expressão de todas as mulheres, em especial proteção contra os ataques às mulheres jornalistas, políticas, artistas e defensoras de direitos humanos;
  1. Defesa da vida de meninas e mulheres, cis, trans e travestis. Enfrentamento ao feminicídio, às violências doméstica, política, física, psicológica, obstétrica, simbólica, moral e patrimonial. Estabelecimento de uma política integral de acolhimento e cuidado de mulheres e crianças em situação de violência. Desenvolvimento de um programa nacional de prevenção à violência sexual e de acolhimento às vítimas e às famílias de vítimas. Formulação de um marco civil de gênero;
  1. Adoção de uma abordagem pacífica para a reforma da política de drogas, com atenção às mulheres que respondem por delitos relacionados a drogas, cuidado pautado na redução de danos. Garantia de direitos e incentivo a produção de dados sobre o tema;
  1. Reforma no modelo de segurança pública – enfrentamento ao encarceramento em massa, aos índices de homicídio da população negra, efetiva implementação da lei de execuções penais (acesso aos autos do processo, remissão pela leitura e cultura, garantia de direitos sexuais, reprodutivos e saúde menstrual, trabalho decente, educação nas áreas tecnológicas e de cultura, estrutura adequada das cadeias e prisões, acesso ao direito de defesa), garantia de saúde mental para pessoas presas e seus familiares. Consulta a pessoas trans, travestis, não-binárias ou intersexo sobre a preferência pela custódia em unidade masculina, feminina ou específica, se houver, com a devida garantia de proteção em qualquer das unidades. Envolvimento dos três entes federados na inclusão e garantia de direitos de adolescentes em conflito com a lei, pessoas encarceradas e seus familiares e egressas;
  1. Recriação do Ministério da Cultura. Desenho e implementação de políticas de memória que valorizem as mulheres. Fomento à cadeia produtiva cultural nacional (leis de incentivo). Políticas de incentivo ao livro e à leitura, com formação de público leitor. Valorização de artistas e sua produção. Criação e manutenção de aparelhos de cultura. Retomada do vale cultura. Respeito à liberdade de expressão artística e cultural;
  1. Valorização dos saberes de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, na garantia da justiça climática e enfrentamento ao racismo ambiental, com implementação e cumprimento das normas ambientais de espectro local e global;
  1. Garantia da implementação de políticas intersetoriais para a proteção integral de mulheres refugiadas, migrantes legais e ilegais.

Aline Torres, Ana Estela Haddad, Ana Lúcia Fontes, Anielle Franco, Anne Moura, Bianca Santana, Carmen Silva, Cecilia Mello, Claudia Costin, Djamila Ribeiro, Erika Hilton, Gabriela Araújo, Gleisi Hoffmann, Inês Virgínia, Isabela Del Monde, Juliana Borges, Juliana Linhares, Lilia Schwarcz, Luciana Santos, Mariliz Pereira Jorge, Marta Suplicy, Natália Dias, Nathalia Oliveira, Neca Setubal, Nina Silva, Patrícia Vanzolini, Preta Ferreira, Rosangela Lyra, Rosiska Darcy de Oliveira, Sheila de Carvalho, Simone Tebet, Tabata Amaral, Tati Bernardi e Vivian Satiro.

Publicado originalmente no Brasil Mulheres.

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