As Universidades públicas brasileiras, comprometidas que são com a pesquisa científica de qualidade, têm, conforme a Constituição Federal, autonomia administrativa e precisam funcionar em um ambiente que valorize a liberdade de expressão e de cátedra, a autonomia dos professores na escolha e no alcance de suas pesquisas a e o convívio respeitoso entre saberes e entre pessoas.
Lamentavelmente, desde que o governo Bolsonaro foi empossado, o cenário é da mais forte corrosão e ataques aos princípios que deveriam orientar a vida acadêmica nas universidades públicas do país.
Em primeiro lugar, violando uma tradição que remonta ao início da redemocratização, o atual governo tem ignorado os nomes dos primeiros colocados nas listas tríplices para reitor, desrespeitando a vontade política de professores, estudantes e funcionários que estão integrados ao cotidiano das universidades públicas. O último caso, dentre mais de dez já ocorridos, é o da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em que o último candidato da lista, detentor de apenas três (3) votos, foi o escolhido pelo Presidente. As próximas indicações dos reitores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) nos causam grande preocupação.
Em segundo lugar – e certamente ainda mais grave – é a perseguição política que tem alcançado vários professores, quase sempre sob a forma de ilegais processos administrativos. Desde o tempo da ditadura civil-militar não se via nada parecido em nosso país. Ainda durante a campanha eleitoral, a antropóloga Débora Diniz, da Universidade de Brasília, foi tão atacada pelos defensores do atual presidente que se viu obrigada a deixar o país, tal o clima de perseguição instaurado. Em seguida, o Ministro da Educação, Abraham Weintraub, acusava professores de estarem comprometidos com ideologias de esquerda e fazerem apenas “balbúrdia” no ambiente universitário. Em tempos mais recentes, processos ilegais têm recaído sobre professores de várias instituições, como é o caso da Universidade Federal do Ceará, onde o Reitor e o Diretor da Faculdade de Direito procuram utilizar procedimentos sumários de responsabilização administrativa contra os professores Beatriz Xavier, Cynara Mariano, Felipe Braga, Gustavo Cabral e Newton Albuquerque tanto pelo fato de que produzem conhecimento na área dos direitos humanos, como por conta de suas atuações sindicais ou em apoio a movimentos organizados da sociedade civil.
É intolerável que tempos autoritários, violentos e obscuros retornem ao nosso país, não apenas porque são incompatíveis com o ordenamento jurídico vigente, mas também – e, nesse caso, especialmente – porque não se pode admitir que o ambiente universitário seja controlado por quaisquer orientações incompatíveis com a liberdade de expressão e cátedra, com a autonomia dos docentes e com o ar democrático sem o qual nenhuma instituição de ensino pode sobreviver.
21 de setembro de 2020
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