Por Fausto Macedo e Pedro Prata
Advogados saem em defesa do ministro presidente do Supremo, alvo de artilharia pesada de promotores e procuradores que o criticam por ter afirmado, em entrevista ao Estadão, que a Lava Jato destruiu empresas e cobrou maior transparência do Ministério Público
Toffoli não está só. Em meio à artilharia pesada a que está sendo submetido por promotores e procuradores, inclusive da força-tarefa da Lava Jato, que o criticam por ter declarado, em entrevista ao Estadão, que a operação ‘destruiu empresas’ e que falta mais transparência ao Ministério Público, o ministro presidente do Supremo recebeu o apoio e a solidariedade de advogados destacados.
“O ministro Toffoli merece o reconhecimento e o aplauso incontido da comunidade jurídica. Com coragem e elegância, fez justificadas críticas à conhecida falta de transparência do Ministério Público. Fez, também, uma análise criteriosa dos conhecidos e inegáveis efeitos econômicos provocados pelos excessos da operação Lava Jato. A esperada reação, entretanto, foi grosseira e inoportuna”, disse Marco Aurélio de Carvalho, advogado especializado em Direito Público, sócio-fundador do Grupo Prerrogativas e membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia.
Para Marco Aurélio de Carvalho, o presidente do Supremo, Dias Toffoli, fez ‘justificadas críticas à conhecida falta de transparência do Ministério Público’.
Em sua página no Twitter, o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato no Paraná, disse que ‘é uma irresponsabilidade’ a declaração de Toffoli de que a Lava Jato destruiu empresas.
“É, assim, fechar os olhos para a raiz do problema, a prática por muitos políticos e empresários de uma corrupção político-partidária sanguessuga, que drena a vida dos brasileiros”, disse Deltan.
“É fechar os olhos para a crise econômica relacionada a fatores que incluem incompetência, má gestão e corrupção”, tuitou Deltan. “É culpar pelo homicídio o policial porque ele descobriu o corpo da vítima, negligenciando o criminoso.”
“Os responsáveis são os criminosos. A Lava Jato aplicou a lei”, arrematou o procurador.
Outro integrante da Lava Jato, Roberson Pozzobon, ironizou o ministro. “interessante comentário de quem instaurou inquérito de ofício”, postou no Twitter, em alusão ao inquérito das fake news, investigação sigilosa que mira críticos da Corte.
Na avaliação de Marco Aurélio de Carvalho, a reação à entrevista de Toffoli ‘revela um sentimento de arrogância e de prepotência, aliado a uma ousadia sem precedentes na relação entre os poderes’.
“Estou certo de que no próprio Ministério Público, órgão sério e indispensável, haverá forte pressão para um efusivo pedido de desculpas. Uma ofensa ao presidente da Corte é, em última análise, uma ofensa a todos os seus integrantes e ao próprio Sistema de Justiça. Lamentável.”
Para o criminalista Antonio Carlos de Almeida Castro Kakay ‘ter a coragem de dizer que os excessos da Lava Jato resultaram na quebra de grandes empresas brasileiras é uma obrigação e não irresponsabilidade’.
“Resta saber quem se beneficiou destes excessos”, questiona Kakay. “E fundamental é esclarecer o destino e os beneficiários do famoso fundo de bilhões, orquestrado por parte de membros da Lava Jato, que em boa hora o Supremo teve a responsabilidade de determinar a apuração.”
O advogado disse, ainda. “Resta saber se aqueles que instrumentalizaram a Lava Jato, agindo em nome de um projeto político, determinaram uma investigação interna para apurar possíveis ilícitos.”
O criminalista Miguel Pereira Neto ponderou. “O MPF, ao requerer a adoção de medidas constritivas, seja de busca-e-apreensão, quebra de sigilo ou prisões cautelares, deveria, em primeiro lugar, ter evitado vazamentos, espetacularização midiática, marginalização do empresário e da empresa, parcialidade no processo, em respeito à presunção de inocência, à dignidade; em segundo, ao invés de pedir a indisponibilidade e bloqueio de ativos, deveria zelar e primar, precipuamente, por medidas visando à preservação da personalidade jurídica, da continuidade do exercício da atividade, mantendo-se o emprego e o desenvolvimento econômico e social. Diante da fragilidade e precariedade das provas, da banalização de medidas precipitadas de exceção e de sua utilização para obtenção de delações em massa, como demonstram os fatos, o prejuízo causado se mostra evidente, desproporcional e causa danos a universalidade e complexidade das empresas, desequilibra o mercado e gera instabilidade e insegurança no próprio sistema.”
Reportagem publicada originalmente em O Estado de São Paulo.
Por Tiago Angelo
Para o advogado criminalista e professor universitário Alberto Zacharias Toron, a operação de fato comprometeu empresas brasileiras, colocando em risco postos de trabalho. Toron foi o responsável pela defesa do ex-presidente da Petrobras Aldemir Bendine. Foi durante a atuação dele neste caso que se firmou a tese de que delatados devem falar após delatores. A determinação ameaça muitas das decisões proferidas pelo consórcio da capital do Paraná.
“O ministro Dias Toffoli, com coragem e muita lucidez, colocou a nu a pior das mazelas da ‘lava jato’: a destruição das empresas nacionais e de empregos essenciais à sobrevivência de muitos trabalhadores. Se a afirmação dessa verdade incomoda os que não tiveram a visão estratégica de preservar a economia, o melhor é relegá-los ao desprezo”, afirma Toron.
O advogado criminalista Bruno Salles Ribeiro diz ser evidente a importância do combate à corrupção. No entanto, de acordo com ele, o Brasil não pode deixar de apurar os delitos causados no decorrer da operação.
“Trata-se de atos de espetacularização que causam danos de imagem em corporações que jamais acabaram por ser responsabilizadas. Trata-se de bloqueios de bens em valores e extensões desarrazoadas que levaram empresas à falência antes mesmo da apuração da responsabilização de seus dirigentes”, diz.
Ainda para ele, com a “lava jato” ficou evidente que “a desproporção na punição cível, criminal e administrativa pode ser tão ou mais danosa do que os próprios atos ilícitos em determinadas circunstâncias”.
Demagogia
A criminalista Paula Sion diz que, “distante do demagogismo que elegeu o governo Bolsonaro, a posição do ministro Dias Toffoli sobre a bancarrota promovida pela operação ‘lava jato’ é totalmente acertada”.
Para ela, “poderíamos ter chegado ao mesmo resultado, tanto em termos de recuperação de ativos como de responsabilização penal, sem promover a execração pública e a falência da nossa construção civil, o que gerou, na prática, desemprego em massa e a entrega do setor para empresas estrangeiras”.
Para a advogada Alessandra Camarano, presidente da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas, é inegável que a atuação dos procuradores teve impacto negativo na economia.
“As consequências sociais para o fechamento de atividades empresariais são gigantescas. Não se pode tratar a questão com o olhar abreviado e despido da responsabilidade em torno das desigualdades perpetratas. O Brasil alcançou o patamar de mais de 13 milhões de desempregados, percentual este que é incrementado com as atividades informais que trabalhadores e trabalhadoras estão submetidos”, diz Alessandra.
Além disso, de acordo com ela, “é também a degradação da dignidade da pessoa humana que precisa ser o foco dos julgadores”. “Quanto mais empresas fecham suas portas, alavancando a balança do desemprego e do desalento, maior o abismo da desigualdade que traz consequências danosas para a sociedade brasileira”.
Para o advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, a declaração de Toffoli foi corajosa, uma vez que tornou evidente que os excessos da “lava jato” trouxeram impactos negativos à economia.
“Ter a coragem de dizer que os excessos da ‘lava jato’ resultaram na quebra de grandes empresas brasileiras é uma obrigação e não ‘irresponsabilidade’. Resta saber quem se beneficiou destes excessos. E fundamental é esclarecer o destino e os beneficiários do famoso fundo de bilhões, orquestrados por parte de membros da operação, que em boa hora o Supremo teve a responsabilidade de determinar a apuração. Resta saber também se aqueles que instrumentalizaram a ‘lava jato’, agindo em nome de um projeto político, determinaram uma investigação interna para apurar possíveis ilícitos”, afirma.
“Combate à corrupção”
De acordo com o advogado e professor universitário Fabiano Silva dos Santos, a operação disseminou a ideia de que para transformar o Brasil seria necessário, primeiro, acabar com a corrupção.
“Mas, por óbvio, isso não aconteceu e o país afundou em uma grave crise. Crise não só de natureza econômica, mas também no que diz respeito às garantias constitucionais dos cidadãos. Empresas foram fechadas, milhares de postos de trabalhos extintos e foram constantes as tentativas de solapar as garantias individuais conseguidas a duras penas na Constituição de 1988”, diz.
Ainda para ele, “a fala do presidente do Supremo Tribunal Federal externa corretamente as constatações desse período, merece todo o respeito e reflexão por parte da sociedade”.
Se a declaração de Toffoli merece respeito, ganhou justamente o oposto por parte dos procuradores da “lava jato”. Essa é a opinião de Daniella Meggiolaro, vice-presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) e presidente da Comissão de Direito Penal da OAB-SP.
“A manifestação do procurador da República Deltan Dallagnol é um desrespeito não apenas à figura do presidente da mais alta corte do país, mas também especialmente às decisões do Supremo Tribunal Federal, que segue enfrentando a arbitrariedade e a ilegalidade, apesar da ‘lava jato’”, diz.
Para o criminalista Miguel Pereira Neto, “o MPF, ao requerer a adoção de medidas constritivas — seja de busca e apreensão, quebra de sigilo ou prisões cautelares —, deveria, em primeiro lugar, ter evitado vazamentos, espetacularização midiática, e marginalização do empresário e da empresa”.
Para ele, “diante da fragilidade e precariedade das provas, da banalização de medidas precipitadas de exceção e de sua utilização para obtenção de delações em massa — como demonstram os fatos —, o prejuízo causado se mostra evidente, desproporcional, e causa danos a universalidade e complexidade das empresas, desequilibra o mercado, além de gerar instabilidade e insegurança no próprio sistema”.
Estrago já foi feito
Para Marco Aurélio de Carvalho, sócio da CM Associados, Toffoli merece reconhecimento da comunidade jurídica por ter tido coragem de fazer críticas à “conhecida falta de transparência do Ministério Público”.
“O ministro fez uma análise criteriosa dos conhecidos e inegáveis efeitos econômicos provocados pelos excessos da ‘lava jato’. A esperada reação dos procuradores, no entanto, foi grosseira e inoportuna. Revela um sentimento de arrogância e de prepotência, aliado a uma ousadia sem precedentes na relação entre os poderes”.
Para a criminalista Dora Cavalcanti, “passados cinco anos da ‘lava jato’, não dá para discordar da avaliação do ministro presidente de que o estrago causado a dezenas de empresas vitais para o desenvolvimento econômico do país não está em linha com o que se espera da celebração de acordos de leniência”.
A criminalista Carmen da Costa Barros argumenta que “o Ministério Público desprezou as funções institucionais que impõem a garantia dos serviços de relevância pública e o zelo pela observância dos princípios constitucionais relativos à atividade econômica”.
Reportagem publicada originalmente no Consultor Jurídico.
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