No dia 25 de dezembro recordamos a trajetória de Sigmaringa Seixas que nos deixou nesta data, um ano atrás. A herança deste ativista dos direitos humanos, combativo advogado e sensível parlamentar foi a luta destemida, e vitoriosa, pelo retorno do Estado de Direito.
Hábil articulador, seu exemplo de serenidade e força impulsiona, hoje, mais do que nunca, ações e movimentos de resistência aos atos de corrosão da democracia brasileira.
O legado de Sigmaringa convida também as forças progressistas a romper o silêncio, sobretudo neste momento político onde “o campo democrático tem enormes responsabilidades para evitar a catástrofe”, como disparou a sirene de alarme do cientista político Marcos Nobre no brilhante texto “Contagem Regressiva”, publicado recentemente na revista Piauí.
“Uma democracia reduzida ao voto não precisa de imprensa livre, Judiciário independente, escola que fomente a tolerância, Legislativo que fiscalize, movimentos sociais de contestação”, adverte o articulista.
Neste pacto pela democracia, vale resgatar a fala do ex-governador de São Paulo, Cláudio Lembo, em debate com juristas registrado pelo blog do jornalista Juca Kfouri em fevereiro passado. Ao comentar sobre o risco de uso do Poder Judiciário como instrumento político, Lembo registrou: “o ativismo jurídico tornou-se uma arma horrível contra a sociedade, particularmente contra aqueles mais fracos dentro da estrutura de poder existente no Brasil”.
Enfrentamos em 2019 o duro combate contra os porta-vozes do autoritarismo que deturpam princípios constitucionais e reverberam –na imprensa e por toda a sociedade– visões equivocadas a respeito de garantias e direitos dos cidadãos. Com uma visão que não alcança os fundamentos do Estado de Direito, apregoam, entre outros disparates, que a presunção da inocência é meramente um “privilégio”, ou um “subterfúgio”.
As consequências de tais concepções para a democracia são nefastas. Construir teses em busca da admiração ruidosa da multidão, fazer parte da farsa “anti-sistema”, é uma tentação que oblitera o fato de que o cumprimento da lei não precisa de aplausos.
Felizmente, o ano se encerra com a vitória do preceito legal da presunção da inocência. E com a reafirmação do poder contramajoritário do Supremo Tribunal Federal.
Reescrever a Constituição não cabe ao Poder Judiciário, nem mesmo interpretá-la de forma seletiva. “Não é dado ao intérprete ler o preceito constitucional pela metade, como se tivesse apenas o princípio genérico da presunção da inocência, ignorando a regra que nele se contém – até o trânsito em julgado”, ponderou a ministra Rosa Weber ao proferir seu voto neste tema.
Em outro front, os embates foram em torno dos graves retrocessos do “pacote anticrime”, do ministro Sergio Moro. Por meio da construção de pontes com o Legislativo, relevantes entidades da sociedade civil se mobilizaram para conter danos, em que pese a desidratação das maldades não ter sido completa.
Para todos aqueles que buscam transformar o Brasil, a garantia dos direitos fundamentais permanece na agenda de 2020. Ao se institucionalizar, no ano de 2019, inclusive com ato carregado de simbolismos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o movimento Prerrogativas, união de mais de 300 estudiosos, especialistas e profissionais do Direito de todo o país, une-se à resistência contra o autoritarismo e no combate para conter o Estado policial que solapa a democracia.
Nesta missão, existe a certeza de que o melhor de Sigmaringa vive em nós. O advogado que levou para a política a necessidade de reconstrução jurídica e institucional do Brasil dedicou-se a “reinstalar a solidariedade humana”, no apelo feito por Nelson Mandela. E exerceu a advocacia com o senso de que qualquer injustiça constitui ameaça para toda a sociedade.
Dar vida, voz e conquistar protagonismo nestas lutas será a nossa eterna homenagem ao inesquecível Sig. Hoje e sempre.
Artigo publicado originalmente no Poder 360.
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