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A crise dos seguros de riscos empresariais e a responsabilidade dos resseguradores

Após sete décadas de tutela prestada pelo Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), ressegurador monopolista que aceitava todos os riscos e garantia o padrão técnico dos serviços de seguro, como a formulação da base das condições das apólices e a execução das regulações de sinistro, o recém-aberto mercado segurador brasileiro enfrenta uma crise crônica.

O cenário era previsto desde antes da abertura do mercado pela Lei Complementar 126/2007 e sua regulamentação. Por isso, foi apresentado um projeto de lei de contrato de seguro (PL 3.555/2004), trazendo vacinas para evitar os desajustes.

Passados 15 anos, é projeto de lei da Câmara a tramitar pelo Senado Federal (PLC 29/2017). Nesse meio-tempo, praticamente todos os países cuidaram de prover leis especiais de contrato de seguro, como Alemanha (2007), Reino Unido (2015), Portugal (2007), Chile (2016), Peru (2017) e Uruguai (2018). Algumas dessas legislações, como a portuguesa e a peruana, inspiraram-se no projeto brasileiro.

No dia a dia, se vê a recusa de asseguramento para diversos riscos, o descarnamento das garantias das apólices e as morosas e restritivas regulações de sinistros. Tudo foi entregue a resseguradores, alguns sem vínculos com os interesses brasileiros, notadamente resseguradores admitidos e eventuais.

A expertise e os investimentos que se esperava fossem feitos no país não vieram. O apoderamento dos executivos das resseguradoras internacionais aqui domiciliados é praticamente nulo, e os brasileiros vêm sendo substituídos por estrangeiros, nos altos cargos.

As nossas indústrias, já combalidas pela crise econômica, quando têm alguma proteção securitária, de regra já não é boa como a de outrora. Os grandes grupos financeiros nacionais — Itaú Bradesco, Banco do Brasil, SulAmérica etc. — já saíram completamente das operações de seguros de riscos empresariais de médio ou grande vulto.

As seguradoras são na maioria dos casos meras atravessadoras de riscos. Atuam como se fossem corretoras em busca de comissionamento pelas responsabilidades cedidas. Suas retenções têm sido mínimas.

Os resseguradores dirigem as regulações de sinistros, impõem a redação das cláusulas das apólices, criações especiais para este “fim de mundo”, e orientam suas interpretações.

O mercado uniformiza-se com essas características. A Susep cuida da solvência, porém, mal disciplina e fecha os olhos para o que acontece com a boa execução das relações securitárias, do ponto de vista do funcionamento dos contratos.

O resseguro é negócio entre seguradora e ressegurador, completamente estranho ao segurado. Diz-se, no latim, “res inter alios”.

O que acontece, do ponto de vista jurídico, é a interferência danosa de terceiro na relação obrigacional de seguro.

Essa patologia que prejudica as partes dos contratos de seguro é fonte de responsabilidade solidária.

Os resseguradores que contribuírem para o inadimplemento do contrato de seguro serão responsáveis solidários por força do artigo 942 do Código Civil brasileiro. Dispõe esse artigo que “[o]s bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado, e, se tiver mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação”.

Não se trata de infirmar a independência e autonomia entre o seguro e o resseguro, mas de atribuir responsabilidade ao ressegurador pelos danos causados por atos próprios em demérito da boa execução dos contratos de seguro.

Assim, cooperando os resseguradores para a causação de danos aos segurados, estes podem cobrar-lhes diretamente a indenização pelos prejuízos sofridos, em regime de solidariedade com a seguradora.

O litisconsórcio, no caso, não é obrigatório. É facultativo. O segurado ou beneficiário prejudicado pode exercer sua pretensão apenas contra a seguradora e, se quiser, incluir o ressegurador no polo passivo.

Texto publicado originalmente no Consultor Jurídico.

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