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A festa macabra de Neymar e da omissão

Por Fabrício Carpinejar

Minha mãe me alertava: se você não sabe diferenciar as más companhias, é que se já tornou a má companhia para os outros.

Será que Neymar não tem nenhum amigo que não seja deslumbrado pelo sucesso para dar a real? Será que não partilha de uma afeição sincera e honesta para frear o seu ímpeto de armar uma festa para 500 pessoas em cinco dias em sua mansão em Mangaratiba (RJ), no meio de uma segunda onda da pandemia?

Onde está o puxão de orelhas do pai, o corretivo de mãe?

Será que não tem ninguém para dizer o óbvio, que não é uma boa ideia, que é o mesmo que fechar um cemitério para balada?

Será que, de todos os amigos, nenhum tem coragem e vergonha na cara para negar o convite, para explicar que não é momento de fazer comemoração, que o Brasil está em sua mais profunda crise sanitária com UTIs lotadas, que o Reveillon deve se limitar a contagem regressiva e discrição?

Será que não existe um único confidente que não tenha medo de enfrentá-lo com a recusa?

Será que não há uma única pessoa esclarecida de seu convívio, que lê jornal e assiste ao noticiário, que possa enquadrá-lo com a verdade? Uma só que não seja seduzida pela riqueza, pela abundância, pela fortuna, pelas passagens de graça, pelo heliporto, pelo cachê, pelo conforto, pelas piscinas majestosas com bebida livre?

Será que ele conta apenas com bajuladores por perto?

Será que não existe um músico com crise na consciência para não subir no palco privado? Com discernimento suficiente para oferecer o exemplo contra aglomerações no fim de ano?

Não existe assessoria de imprensa, não existe consultoria de imagens?

Neymar será sumariamente cancelado. Porque ele mesmo terá cancelado o Brasil antes, a nossa realidade de pânico e penúria, contrariando de frente o isolamento social ainda necessário antes da vacinação.

Ele não entendeu que não há diferença entre a sua vida privada e a pública, que não é apenas um jogador de futebol, mas um exemplo moral para milhões de crianças e adolescentes.

Organizar uma festa com shows diários para centenas de convidados não é alienação. Ultrapassa qualquer nível de desprezo.

É o mais abominável insulto, é ofender 190 mil famílias enlutadas, é sapatear nos cadáveres dançando funk até a cova, é zombar dos profissionais de Saúde trabalhando em condições precárias para conter a COVID-19.

Entre o país e os seus parças, Neymar parece que já escolheu o seu lado. Está de costas para o país. E não vem merecendo a camiseta amarela de número dez.

Publicado originalmente na coluna de Juca Kfouri no UOL.

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