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Pune-se menos intensamente um, para fazê-lo mais severamente com muitos

Os irmãos Batista, na confissão de seus crimes, negociaram vantagens singulares. Para os críticos, houve benevolência. O Ministério Público diz que os benefícios para o país compensam o custo

colaboração premiada é um instituto em que Ministério Público e colaborador fazem uma análise de custo-benefício. Consideram o que estão dispostos a perder ante o que poderão ganhar.

Sem dúvida, é um meio importante e eficaz para que se investigue, processe e puna certos crimes que, dificilmente, seriam descobertos sem o auxílio de um de seus membros.

O preço a pagar será uma punição mais branda e, no extremo, até mesmo deixar de punir, quem mereceria uma pena mais severa. Pune-se menos intensamente um, para fazê-lo mais severamente com muitos.

Todavia, no caso do acordo de colaboração processual firmado pelo MPF com Joesley e Wesley Batista, o prêmio foi desproporcional, exagerado e, para muitos, causou verdadeira revolta.

Foi concedido aos irmãos Batista o benefício máximo previsto na Lei 12.850/2013: não serão sequer processados, uma vez que lhes foi concedida a chamada imunidade processual. Além disso, no caso de processos que já estejam em curso, envolvendo os fatos incluídos no acordo, serão beneficiados com o perdão, que implica a extinção da punibilidade.

Ademais, o MPF somente compartilhará provas e documentos com autoridades estrangeiras para uso contra o colaborador ou prestará cooperação jurídica internacional para tal finalidade, se a autoridade estrangeira firmar acordo de colaboração “cujas condições e o efeito exoneratório sejam, no mínimo, equivalentes” aos do acordo brasileiro. É muita benesse no Brasil e também no exterior!

O ponto mais criticável do acordo é que, no caso de Joesley Batista, num aspecto o acordo foi ilegal: a imunidade processual é expressamente vedada, no inciso I do § 4o do Art. 4o, caso o colaborador seja o líder da organização criminosa. Considerando que Joesley é presidente da holding J&F, controladora da JBS, da Eldorado Brasil e mais dezenas de empresas, como líder máximo do grupo, cabia-lhe a última palavra em todas as decisões, lícitas e ilícitas. Não havia nenhum outro membro que atuasse na organização criminosa que buscasse benefícios ao grupo J&F que, em sua estrutura hierárquica, estivesse sobreposto ao presidente da holding.

O acordo também merece críticas por não ter estabelecido, expressamente, que os colaboradores estariam impedidos de exercer qualquer função de direção ou administração nas empresas controladas pela holding J&F. É o que se espera de uma empresa como a JBS, que tem em seu manual de conduta que seus líderes são “responsáveis por estimular uma cultura de integridade” e deve comunicar a “seus colaboradores a relevância do cumprimento desses padrões, incentivando a conduta ética e o cumprimento da lei, sendo ele próprio, por suas ações, exemplo dessa conduta”.

O benefício da imunidade processual diminui consideravelmente o controle jurisdicional sobre o acordo porque, embora tendo sido homologado judicialmente, a concessão do prêmio máximo não dependerá de uma posterior análise do grau de efetividade da colaboração. Isso porque não há processo nem sentença!

É inegável que há um custo para romper com um sistema corrupto. Mas não é qualquer preço que se deve pagar para tanto.

Texto publicado originalmente na Revista Época.

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