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A direita abriu o jogo: o queremismo está na mesa, por Luiz Eduardo Soares

A direita abriu o jogo: o queremismo está na mesa, por Luiz Eduardo Soares

Por Luiz Eduardo Soares

“Confesso, com o estômago embrulhado, que nunca me senti tão mal reconhecendo erros meus quanto, agora, ao reconhecer meu acerto”

Confesso, com o estômago embrulhado, que nunca me senti tão mal reconhecendo erros meus quanto, agora, ao reconhecer meu acerto. No dia 20 de maio, em artigo publicado pelo GGN, comentei a subestimação midiática dos atos contra o governo, ocorridos na véspera: “Enquanto o povo vai às ruas, as elites se recolhem, planejando seus lances, e começam, tudo indica, a examinar a hipótese QUEREMISTA: Pós-Bolsonaro com Bolsonaro. Não duvidem, meus amigos, minhas amigas: o ardor moralista desses vetustos patriotas é tão volúvel quanto são elásticos seus elevadíssimos valores.”

Neste domingo, dia 19 de setembro, o editorial de O Globo não deixa mais dúvidas de que a maior rede de comunicação do país está de braços abertos, pronta para acolher a candidatura Bolsonaro, disposta a apoiar um segundo mandato, se ele prometer ser um bom menino, daqui em diante: “Faria bem Bolsonaro se decidisse, inspirado na carta escrita com o ex-presidente Michel Temer, dar meia-volta também nos temas ligados ao meio ambiente e direitos humanos. Se conseguir mostrar ao mundo seu lado “Jair Peace and Love”, talvez começasse a reverter os danos que seu governo causou ao país na cena internacional. É improvável que convencesse a todos, mas seria, pelo menos, um começo.” (O Globo, editorial).

Está ficando claro pela sequência de pesquisas que uma candidatura viável não se inventa e que a única opção minimamente competitiva à direita contra Lula será mesmo o garimpeiro genocida do Planalto. No jantar em São Paulo, homenageando a intervenção de Temer que devolveu o impeachment à estaca zero, os digníssimos comensais confundiram terceira via com terceira idade.  A ceia dos barões cavilosos que riem está condenada a varar noites e dias. Sem sabê-lo, protagonizaram o ágape em looping de Buñel: O Anjo Exterminador. Se procuravam o tertius, beberão para sempre, o banquete não terá fim.

Compreendendo tudo isso e pragmáticos como são, porta-vozes da elite já ensaiam o desembarque do desembarque do bolsonarismo e começam a preparar o recuo do recuo, sugerindo que talvez o fascista não seja tão ruim assim, talvez os militares a seu lado só queiram o bem da pátria, talvez tudo não passe de um mal-entendido, nada que não possa ser esquecido e superado em nome do futuro do país. Nada que um brinde em torno da mesa de brancos bilionários não dilua, nada que um bom vinho não torne palatável.

Esse movimento lança pontes sobre o abismo (a tal pinguela para o futuro) e acena para Bolsonaro, como que a sussurrar em seus ouvidos: respeite a austeridade fiscal, cultue o teto de gastos, mantenha a agenda neoliberal selvagem, preserve a lealdade subalterna ao imperialismo e venha conosco, que o sangue a gente limpa. Consulte um coach de boas maneiras, passe a comer com garfo e faca, não limpe o nariz no guardanapo, que, do resto a gente cuida. Diga na ONU alguma coisa que justifique nossa mudança, para que a possamos atribuir à sua elogiável metamorfose, e nos permita levar adiante o projeto queremista.

O próximo passo seria centrar fogo em Lula, mostrar que sua eventual eleição significaria um desastre econômico: o país cairia prostrado na estagflação, haveria desemprego e aumento da miséria. Já imaginaram um futuro assim ameaçador? Creiam: não há limites para o cinismo, quando se trata de manter privilégios de classe e a alma já foi negociada há décadas, na era em que as virtudes estavam em alta no mercado de pecados capitais.

Artigo publicado originalmente no Jornal GGN.

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