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Em áudio, Deltan diz que juíza se comprometeu a sentenciar caso de Lula

Por Jamil Chade e Nathan Lopes

Então coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, o procurador Deltan Dallagnol falou em um áudio enviado a colegas sobre uma conversa que manteve com a juíza Gabriela Hardt a respeito do processo do sítio de Atibaia (SP), em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) era réu. Hardt havia assumido a ação após a saída de Sergio Moro.

No áudio (ouça acima), Deltan conta que encontrou Hardt, perguntou sobre o processo do ex-presidente e ouviu como resposta que o caso seria sentenciado, o que de fato ocorreu menos de um mês depois. Especialistas ouvidos pelo UOL divergem na avaliação sobre se essa relação entre juízes e magistrados seria ilegal ou antiética.

Para a defesa de Lula, as mensagens mostram que “os procuradores queriam a qualquer custo impor nova condenação” a Lula. “E a pressão foi atendida com a sentença.”

Os defensores dizem ainda que os procuradores do MPF (Ministério Público Federal) temiam uma mudança no andamento dos processos da Lava Jato assim que fosse definido o novo titular da 13ª Vara Federal de Curitiba —o cargo de Hardt é de substituta do titular da Vara. Moro deixou sua posição em novembro de 2018 para entrar na política e ser ministro da Justiça do governo de Jair Bolsonaro (sem partido).

Os diálogos, apresentados hoje pela defesa de Lula ao STF (Supremo Tribunal Federal), foram extraídos de mensagens obtidas por meio de um ataque hacker, alvo da Operação Spoofing.

Esse não é o primeiro áudio divulgado. Em outubro de 2020, o site The Intercept havia revelado como procuradores da Lava Jato discutiram sobre a sucessão de Moro.

“Poderia sentenciar, né”

Em 9 janeiro de 2019, o procurador regional Antônio Carlos Welter comentou que havia encontrado o então presidente do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores.

Na ocasião, Flores disse que não sabia quem poderia ser o substituto de Moro, mas que torcia por ser “alguém com ‘perfil’ adequado”. “Mas como é antiguidade que vai definir, ele não pode fazer nada”, escreveu Welter em grupo no Telegram.

Na sequência, o procurador Paulo Galvão disse que “ela [Hardt] poderia sentenciar o sítio, né”. A procuradora Jerusa Viecili respondeu, informando que a juíza “iria sentenciar”. Em dezembro, a Lava Jato já havia, em planilha, indicado à substituta temporária de Moro as prioridades da força-tarefa.

No dia seguinte, 10 de janeiro de 2019, em áudio, Deltan comentou sobre um encontro com a magistrada. “Perguntei dos casos né, perguntei primeiro do caso do sítio, se ela ia sentenciar.”

Hardt, segundo Deltan, mostrou uma pilha de papel, que era uma cópia das alegações finais da defesa de Lula no processo do sítio, com cerca de 1.600 páginas. A magistrada pontuou que tinha outros “500 casos”. “Que horas eu vou fazer isso aqui? Só se eu vier aqui e trabalhar da meia noite às seis”, teria dito Hardt, segundo Deltan.

O procurador, então, explica que ela está sobrecarregada, mas que ela iria “sentenciar o sítio”.

O que dizem os envolvidos

Em nota, o MPF disse que “é legítimo e legal que membros do Ministério Público despachem com juízes, como advogados fazem”.

O órgão também afirmou que “a eventual preocupação com a demora do julgamento dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo pessoas beneficiadas pela prescrição reduzida em razão da idade, como o ex-presidente Lula, demonstra zelo pelo interesse público”.

“Ainda que os diálogos tenham ocorrido da forma como apresentados, só demonstrariam o zelo do Ministério Público e a independência e a imparcialidade da juíza”, disse o MPF.

A reportagem ainda não recebeu resposta de Hardt, consultada por meio da assessoria de imprensa da Justiça Federal no Paraná.

Sentença proferida

condenação de Lula no caso do sítio aconteceu cerca de um mês depois, em 6 de fevereiro de 2019. Logo depois, o juiz Luiz Antônio Bonat, por critério de antiguidade, foi escolhido como sucessor de Moro. Ele assumiu o cargo em março do mesmo ano.

A condenação proferida por Hardt foi confirmada pelo TRF-4 no final de 2019, mas teve uma polêmica. A juíza copiou trecho da sentença de Moro no caso do tríplex, primeira condenação contra o petista na Lava Jato.

Publicado originalmente no UOL.

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