Por Mariana Muniz
Escolhida em lista tríplice, advogada Daniela Teixeira cobra maior representação feminina no Judiciário e critica proposta de mandatos fixos para ministros de tribunais superiores
Aprovada pelo Senado após indicação do Planalto, a advogada Daniela Teixeira, nova ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), critica a baixa representação feminina no Judiciário e defende mudança na lei sobre drogas, mas afirma que descriminalização prejudicaria jovens. Leia a entrevista abaixo.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem 33 ministros, mas só cinco mulheres. Como vê a discrepância?
Eu sinto muito por quem não consegue enxergar e chama a gente de ativista feminista radical. Não é radicalismo. O olhar feminino é absolutamente necessário, especialmente numa ciência humana que vai julgar pessoas e fatos. Como pode sermos 50% da população, mas ainda assim existirem tribunais onde há mais “Luizes” do que mulheres? Só no Supremo Tribunal Federal (STF) são quatro “Luizes” e uma mulher. (Referência aos ministros Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Luiz Edson Fachin e André Luiz Mendonça).
Tudo indica que a vaga no STF aberta com a aposentadoria da ministra Rosa Weber será preenchida por um homem. O que acha dessa escolha?
É uma prerrogativa do presidente da República. É um cargo político, mais até do que jurídico. Eu me preocupo mais com a falta de mulheres nos outros tribunais, nas instâncias inferiores, que são os lugares onde as questões envolvendo as vidas das pessoas são definidas. A gente muda o Judiciário pela base.
A carreira de Rosa Weber no STF
É a favor da adoção de cotas para mulheres no Judiciário?
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) iniciou um processo para diminuir a discrepância na promoção de desembargadores. É um caminho irreversível. Também é importante sempre haver o nome de pelo menos uma mulher nas listas que são enviadas para o presidente da República, regra que vale para as nomeações nos tribunais superiores, como STJ, Tribunal Superior do Trabalho (TST) e Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Dessa forma, não haverá como argumentar que não tinha, no leque de escolhas, pelo menos uma mulher. Em todas as listas que eu tiver que votar daqui para a frente, sempre votarei para que exista pelo menos uma mulher. Todo mundo acha normal que a maioria seja de homens. Quando perguntaram para a ministra já falecida Ruth Bader-Ginsburg (da Suprema Corte dos EUA) qual seria a quantidade ideal de mulheres, ela disse nove, que é o número total de ministros. Eu não chego a esse ponto, mas acredito na paridade.
O que pensa da criação de mandatos para ministros de tribunais superiores, proposta em debate no Senado?
É uma proposta ruim. O Judiciário precisa de independência e não pode se submeter à opinião política. O integrante do Judiciário não foi eleito, e essa é uma garantia da democracia. A estabilidade do juiz existe justamente para que ele possa decidir sem se preocupar com interesses políticos, o que confere segurança jurídica. Estipular mandato afeta a independência.
A senhora vai atuar na área criminal do STJ. É preciso mudar a legislação sobre drogas?
Acredito que sim. É preciso que seja mais bem definido, pela lei, quais são as quantidades que tornam alguém usuário ou traficante. Essa definição tem ficado sempre na conta dos juízes, que fazem de forma diferente, sem uniformização. Isso leva ao fato mais do que comprovado de que pessoas brancas com uma determinada quantidade são consideradas usuárias, enquanto pessoas negras são punidas como traficantes. O legislador vai ter que fazer essa definição de forma bem minuciosa.
É a favor da descriminalização das drogas?
Sou contra. A minha experiência com jovens criou em mim a opinião de que realmente não há nenhuma quantidade de droga que seja segura ou positiva. O impacto na vida dos jovens é muito grande.
O que pensa a respeito da atual legislação sobre o aborto no Brasil? Também entende que é preciso haver uma mudança?
Eu concordo com o entendimento do ministro (Luís Roberto) Barroso de que o país não está preparado, neste momento, para esse debate. É o que posso dizer, até porque eventualmente terei que me deparar com este tema nos julgamentos de que participarei.
O perfil da senhora como advogada sempre foi definido como progressista e garantista. Vai seguir assim?
Acho estranho quem não é progressista. Cada um tem que cuidar da sua própria vida, viver seguindo os preceitos do direito à felicidade. Quanto ao garantismo, acho que todo juiz obrigatoriamente deva ser garantista, que é dar ao cidadão o direito de ter as suas garantias fundamentais respeitadas. É o juiz cumprir o que está na Constituição e nas leis. Isso significa dizer que o processo não tem capa, que o réu não tem nome, e que a pessoa presa, por exemplo, será colocada em liberdade se esse for o direito dela.
Entrevista publicada originalmente em O Globo.
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