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Sem ‘mas’ e sem Hamas

Sem ‘mas’ e sem Hamas

Por Juca Kfouri

Grupo é terrorista, ‘mas’; Netanyahu não é melhor, ‘mas’; basta de adversativas

O que o grupo terrorista Hamas fez no dia 7 de outubro não encontra justificativas de ordem alguma por mais opressiva e inaceitável que seja historicamente a situação na Faixa de Gaza. A reação desproporcional de Bibi Netanyahu igualmente não tem perdão e iguala a ação governamental aos atos do Hamas.

Não é falsa simetria coisa nenhuma. Como o Hamas tem a desfaçatez ao dizer que seus objetivos eram militares ao invadir rave e kibutzim, mente Israel ao declarar que se esmera para não matar civis.

O Hamas age para que a reação aos seus atos aumente a indignação do lado árabe e Bibi faz o jogo dele, pessoa física, e do Hamas, pessoa jurídica. O jogo dele é o de um extremista de direita corrupto em busca de sobrevida política como fez o ditador Leopoldo Galtieri, o general que levou 649 jovens argentinos à morte no confronto com a Inglaterra de Margaret Thatcher, que perdeu 255 soldados nos dois meses da Guerra das Malvinas, em meados de 1982.

Galtieri e a ditadura caíram em seguida, destino que Bibi deverá seguir com as mãos ensanguentadas pelo terror imposto ao terror.

Nada mais exemplar para os dias vividos pelo planeta que a dificuldade das pessoas em chamar as coisas por seus nomes e achar “mas” e “mas” para puxar a sardinha para suas brasas, mesmo que nelas sejam queimadas crianças, mulheres, idosos e civis, de ambos os lados.

Que a única solução duradoura para o conflito é o Estado Palestino soberano, como determinou a ONU há mais de meio século, é chover no molhado.

A imediata devolução dos reféns pelo Hamas, o cessar-fogo e a ajuda humanitária às vítimas se impõem.

Parar de amenizar as mais de 11 mil mortes em Gaza como reação às mais de 1.000 em Israel, idem.

Deixar de mentir sobre quem é mais cruel, idem ibidem.

Responder com antissemitismo à estupidez de Bibi é dar a vitória ao Hamas, tudo o que deseja quem não quer a paz. Insuflar a islamofobia é consagrar os métodos de Bibi.

O governo Netanyahu foi eleito, dizem os extremistas que o apoiam para chamar de democrático o governo de Israel. É verdade. Adolf Hitler também foi fruto da democracia.

Quem é tratado feito animal reage como tal, argumentam os extremistas em apoio ao Hamas. É fato. E morrem milhares de inocentes que não escolheram agir como animais.

“O Hamas errou, ‘mas’, também, vive em prisão a céu aberto. Reagiu”, dizem os rubros-negros.

“O governo de Israel passou dos limites, ‘mas’, também, tinha de reagir ao maior ataque aos judeus desde o Holocausto“, retrucam os tricolores.

E não aparece Diego Maradona para fazer o gol com a mão de Deus para botar a questão em outros termos.

Dia desses, ao almoçar com brilhante economista, e otimista amigo judeu, sobre a aparente não solução no Oriente Médio, ouvi dele surpreendente previsão: “Esta guerra acabará em poucos dias, Netanyahu cairá e o Estado da Palestina é inevitável”, cravou.

Não satisfeito, saiu-se com esta, já no café, como se estivesse brincando com assunto tão sério, qualidade rara de quem brinca consigo mesmo: “E a solução para Jerusalém é muito mais simples do que pensam: basta entregá-la para o Vaticano administrar”.

Registre-se que em nenhum momento o amigo usou a indevida conjunção adversativa. O “mas” está fora de seu vocabulário.

Se não tem “mas”, tem “mais”: mais humanismo, menos terrorismo.

Artigo publicado originalmente na Folha de S.Paulo.

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