Por Elizeu Soares Lopes
Números mostram que os negros são, em geral, as maiores vítimas no país
Reduzir a violência no Brasil, qualquer tipo de violência, passa obrigatoriamente pelo combate ao racismo sistêmico. Sem essa compreensão vamos apenas andar de lado.
Relatório da Ouvidoria da Polícia de São Paulo, que apresentamos recentemente com dados do ano de 2020, mostra que 56,3% dos mortos em decorrência de ação policial no estado são negros. Esse percentual deve ser ainda maior se considerarmos que em 10% dos casos a cor da pele da vítima não foi identificada no boletim de ocorrência ou no laudo necroscópico.
Não é uma questão apenas de violência policial. Dados do Monitor da Violência apontam que 75% das vítimas de feminicídio no primeiro semestre do ano passado eram negras. Há outros dados que apontam que os negros são, em geral, as maiores vítimas da violência.
Racismo não é novidade, nem no Brasil e nem no mundo. Um século e meio atrás pessoas com pele de cores preta e parda eram propriedades dos brancos, assim como os cavalos ou as terras e tudo o que era produzido nelas.
Pouco mais de 50 anos se passaram desde que os Estados Unidos permitiram que brancos e negros frequentassem as mesmas escolas, os mesmos ônibus e os mesmos bares e que negros pudessem votar sem discriminação. O apartheid na África do Sul terminou há menos de 30 anos. Os resquícios dessas políticas permanecem ainda hoje em forma de preconceito, discriminação e racismo.
Se o racismo incomoda —e como incomoda! —, é ainda mais triste entender que ele muitas vezes nem sequer é percebido até mesmo pela própria vítima. Em 2020, das 5.163 denúncias recebidas pela Ouvidoria da Polícia, em apenas 16 casos os denunciantes informaram a
raça/cor da vítima. Em outras palavras, apenas 0,3% dos denunciantes demonstraram acreditar que a cor da pele foi determinante para a violência.
É aterrador, mas não temos medo de enfrentar o problema. Na esfera da Ouvidoria da Polícia estamos buscando fazer a nossa parte, trazendo a questão racial para discussão nas forças de segurança do estado de São Paulo.
Criamos um grupo de trabalho para tratar especificamente da questão do racismo nas polícias e apresentar propostas para combater o problema. Convidamos representantes da sociedade civil e dos comandos das próprias polícias civil e militar para garantir que propostas apresentadas sejam factíveis. Os integrantes estão reunindo propostas da sociedade e da academia para formular sugestões que possam ser implantadas na prática.
Por ter nascido negro, pelo orgulho que tenho da minha família —mãe, pai, irmãos e filhos, todos negros— e por ocupar tão importante função pública a mim outorgada pela sociedade civil organizada representada no Condepe (Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana) e pelo governador do estado, tenho a obrigação de lutar contra esse crime que tanto mal e dano humano causa à nossa sociedade. Ser negro não é uma escolha. Ser racista é!
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